O que é fundo eleitoral? Como os partidos o dividem durante as eleições?
O fundo eleitoral é uma reserva de dinheiro público que tem como função financiar as campanhas eleitorais. A liberação desse dinheiro acontece apenas em ano de eleição e o valor distribuído é aprovado junto com a Lei Orçamentária Anual (LOA) — que passa pelo Congresso ao fim de cada ano para definir como serão aplicados os recursos da União no ano seguinte.
Em 2021, os parlamentares aprovaram o envio de R$ 5,7 bilhões para o financiamento de campanhas. O valor é mais do que o dobro do que foi liberado para as eleições municipais em 2020 (R$ 2,03 bilhões), fato que provocou controvérsia. O presidente Jair Bolsonaro, no entanto, aprovou o encaminhamento de R$ 4,9 bilhões para o fundo.
Não há nenhum estudo ou regra que estabeleça um valor ideal para que a União encaminhe aos partidos. Ana Claudia Santano, coordenadora geral da Transparência Eleitoral Brasil, explica que o financiamento público é algo comum nas democracias. “O que a gente pode se questionar é de custear as campanhas totalmente com recursos públicos. Porque as necessidades dos partidos sempre serão infinitas. Então, se eles precificaram com esse tanto de milhões de reais para 2022, em um contexto altamente competitivo, a gente vai ficar aumentando ilimitadamente o valor. Eu contesto essa dinâmica”, diz.
Por outro lado, há quem discorde do financiamento privado. Como foi o caso da petição apresentada em 2011 pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) ao Supremo Tribunal Federal. A OAB argumentou que as doações de empresas desequilibram a competição eleitoral, visto que apenas uma pequena parcela de políticos teria acesso a tais recursos. O tema gera debates e muitas dúvidas. Pensando nisso, o InfoMoney produziu um guia completo com tudo o que você precisa saber sobre o fundo eleitoral. Confira abaixo.
O que é fundo eleitoral
O fundo eleitoral é uma reserva de dinheiro público destinada ao financiamento de campanhas. O seu nome oficial é Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC).
Ele foi criado em 2017, dois anos após o Supremo Tribunal Federal (STF) considerar as doações de empresas para campanhas inconstitucionais. “Como forma de compensar a perda de recurso [que vinha pelo financiamento privado], o Congresso Nacional aprovou a criação do fundo eleitoral”, explica Rodolfo Tamanaha, professor de Direito da Faculdade Presbiteriana Mackenzie Brasília e sócio do Madrona Advogados.
Além dele, existe o fundo partidário, implementado em 1965 para custear a estrutura dos partidos (pagamento de contas e salários, por exemplo). O FEFC é “sazonal”, ou seja, só é constituído em anos eleitorais. O dinheiro do fundo partidário, por sua vez, é distribuído mensalmente às siglas.
Como surgiu
O fundo eleitoral surgiu na esteira do fim do financiamento privado de campanha. Em 17 de setembro de 2015, o Supremo Tribunal Federal considerou que as doações realizadas por empresas a campanhas eram inconstitucionais.
A ação analisada pelos ministros corria no Tribunal desde 2011. Naquele ano, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) argumentou que a contribuição financeira de empresas desequilibrava a disputa eleitoral, uma vez que as campanhas com maior volume de doações teriam mais estrutura para se fazerem conhecidas do que aquelas menos favorecidas. Além disso, foi pontuado que o financiamento privado poderia favorecer o desenvolvimento de relações espúrias entre empresas e partidos, abrindo portas para a corrupção.
O julgamento, no entanto, se deu apenas em 2015 — segundo ano de operação da Lava Jato. Mônica Sodré, diretora-executiva da Rede de Ação Política e Sustentabilidade (RAPS), diz que a força tarefa contribuiu para o entendimento firmado pelos ministros. “Por conta da Lava Jato cristalizou-se essa percepção na opinião pública de que a empresa desequilibrava o jogo eleitoral e de que boa parte da corrupção passava pela presença das empresas na política.
Com a perda da fonte de recursos, os congressistas propuseram a criação do fundo eleitoral. O projeto original é de autoria de Ronaldo Caiado (DEM-GO), que naquele período era senador. O texto aprovado pelo Senado, no entanto, foi apresentado por Armando Monteiro (PTB-PE), relator da proposta no plenário da Casa.
Mônica Sodré pontua que há três maneiras de sustentar as campanhas eleitorais em todo o mundo, sendo a doação por empresas uma delas. “Historicamente os países do mundo precisam financiar as suas democracias e, portanto, financiar suas eleições como um elemento que compõe a democracia. Isso tem um custo e só tem três jeitos de fazê-lo: primeiro doações feitas por pessoas físicas e militância; segundo com recursos públicos; e o terceiro via contribuições de empresas”, explica.
“No Brasil, a gente não tem a cultura do primeiro. Em geral, as pessoas não doam para campanhas eleitorais, mesmo com toda a mobilização de vaquinhas, de tentativas de pulverizar as doações. E o terceiro foi proibido pelo STF em 2015. Então considerando que só tem três jeitos, sendo que um não conta com adesão da população e outro foi proibido, só sobrou recurso público”, conclui.
Como funciona o fundo eleitoral
A função do fundo é financiar as campanhas eleitorais. O dinheiro que, eventualmente, tenha sobrado no custeio das candidaturas deve ser devolvido para o Tesouro Nacional. Não é permitido o uso dos recursos para outros fins que não a realização de campanhas.
O total de recursos a ser distribuído é definido pelo Congresso e incluído na Lei Orçamentária Anual (LOA). Em 2018, foi repassado R$ 1,7 bilhão para os partidos. Em 2020, foram R$ 2,03 bilhões. Para 2022, o valor aprovado pelos parlamentares foi de R$ 5,7 bilhões.
Esse dinheiro é depositado pelo Tesouro Nacional em uma conta do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) no Banco do Brasil no início do mês de junho do ano em que serão realizadas as eleições.
Em até 15 dias, a partir da data de recebimento dos recursos pelo TSE,o valor total do fundo deve ser divulgado no Portal da Transparência do Tribunal. Em 2022, a quantia deve ser publicada até 16 de junho.
A Lei 13.487 de 6 de outubro de 2017, que cria o fundo eleitoral, determina que a distribuição do dinheiro seja feita da seguinte maneira:
- 2% do total é dividido entre todos os partidos com estatuto reconhecido pelo TSE;
- 35% é rateado entre as agremiações com pelo menos um parlamentar eleito para a Câmara, com base na proporção de votos que cada bancada recebeu na última eleição para a Casa;
- 48% é distribuído proporcionalmente ao tamanho das bancadas atuais da Câmara;
- 15% é repassado aos partidos com representação no Senado, também seguindo a proporção do tamanho de suas bancadas.
De acordo com o TSE, os cálculos para a divisão do fundo consideram as retotalizações de votos realizadas até o primeiro dia útil de junho do ano da eleição. Os deputados que migraram de partido, porque a sigla foi extinta devido à cláusula de barreira, não são contabilizados para determinar a proporção dos recursos destinados às agremiações. Por causa da Emenda à Constituição nº 111/2019, os votos dados a concorrentes negros ou a candidatas serão contados em dobro. A regra vale até 2030.
Uma vez encaminhada aos partidos, a verba deve ser dividida entre candidatos e diretórios regionais conforme as regras aprovadas por cada legenda, que devem ser informadas ao TSE. Além disso, esses critérios devem ser publicados na página de cada agremiação. “A divisão tem que ser aprovada pela maioria absoluta da mesa diretora da executiva nacional do partido e os critérios de divisão interna têm que ser registrados no TSE, senão o dinheiro não é liberado”, explica Ana Claudia Santano, coordenadora geral da Transparência Eleitoral Brasil. A única exigência estipulada por lei é que 30% dos recursos devem ser destinados a candidatas mulheres e outros 30% a campanhas de pessoas negras.
Quais partidos têm acesso
Todos os partidos que têm o estatuto reconhecido pelo TSE podem receber uma parte dos 2% do fundo destinados aos partidos em geral. São eles:
- Avante
- Cidadania
- DC
- MDB
- Novo
- Patriota
- PCB
- PC do B
- PCO
- PDT
- PL
- PMB
- PMN
- Podemos
- PP
- Pros
- PRTB
- PSB
- PSC
- PSD
- PSDB
- PSOL
- PSTU
- PT
- PTB
- PTC
- PV
- Rede
- Republicanos
- Solidariedade
- União Brasil
- UP
Os outros 98% do fundo são distribuídos proporcionalmente ao tamanho das bancadas dos partidos na Câmara e no Senado.
De onde sai o dinheiro do fundo eleitoral
O fundo é constituído por recursos da União no ano eleitoral. O valor deve ser equivalente ao definido pelo TSE em cada eleição e ao percentual do montante total dos recursos disponíveis para as emendas impositivas das bancadas estaduais, que são aprovadas no projeto de lei orçamentária (LOA).
Quem votou a favor do fundo eleitoral
O projeto de lei (PLS 206 de 2017) que deu origem ao fundo eleitoral foi criado no Senado. Foi aprovado por uma margem pequena de vantagem: 33 senadores foram favoráveis, 31 foram contra e um se absteve.
Voto por bancada
CIDADANIA | ||
Parlamentar | UF | Voto |
Cristovam Buarque | DF | NÃO |
Total CIDADANIA: 1 |
DEM | ||
Parlamentar | UF | Voto |
Davi Alcolumbre | AP | SIM |
Ronaldo Caiado | GO | NÃO |
Total DEM: 2 |
MDB (ex-PMDB) | ||
Parlamentar | UF | Voto |
Airton Sandoval | SP | SIM |
Dario Berger | SC | NÃO |
Eduardo Braga | AM | NÃO |
Fernando Coelho | PE | SIM |
Garibaldi Alves Filho | RN | SIM |
Hélio José | DF | SIM |
João Alberto Souza | MA | SIM |
José Maranhão | PB | SIM |
Kátia Abreu | TO | SIM |
Raimundo Lira | PB | NÃO |
Renan Calheiros | AL | NÃO |
Roberto Requião | PR | ABSTENÇÃO |
Simone Tebet | MS | NÃO |
Valdir Raupp | RO | SIM |
Waldemir Moka | MS | NÃO |
Total MDB: 14 |
PC do B | ||
Parlamentar | UF | Voto |
Vanessa Grazziotin | AM | SIM |
Total PC do B: 1 |
PDT | ||
Parlamentar | UF | Voto |
Acir Gurgacz | RO | NÃO |
Total PDT: 6 |
PL (ex-PR) | ||
Parlamentar | UF | Voto |
Cidinho Santos | MT | NÃO |
Magno Malta | ES | NÃO |
Vicentinho Alves | TO | SIM |
Wellington Fagundes | MT | SIM |
Total PL (PR): 4 |
PODEMOS | ||
Parlamentar | UF | Voto |
Álvaro Dias | PR | NÃO |
José Medeiros | MT | NÃO |
Romário | RJ | NÃO |
Total Podemos: 3 |
PP | ||
Parlamentar | UF | Voto |
Benedito de Lira | AL | SIM |
Ciro Nogueira | PI | SIM |
Ivo Cassol | RO | SIM |
Roberto Muniz | BA | SIM |
Wilder Morais | GO | SIM |
Total PP: 5 |
PSB | ||
Parlamentar | UF | Voto |
Antonio Carlos Valadares | SE | NÃO |
João Capiberibe | AP | NÃO |
Lídice da Mata | BA | SIM |
Lúcia Vânia | GO | NÃO |
Roberto Rocha | MA | SIM |
Total PSB: 5 |
PSC | ||
Parlamentar | UF | Voto |
Pedro Chaves | MS | NÃO |
Total PSC: 1 |
PSD | ||
Parlamentar | UF | Voto |
Lasier Martins | RS | NÃO |
Omar Aziz | AM | NÃO |
Otto Alencar | BA | NÃO |
Total PSD: 3 |
PSDB | ||
Parlamentar | UF | Voto |
Aécio Neves | MG | SIM |
Antonio Anastasia | MG | SIM |
Ataídes Oliveira | TO | NÃO |
Cássio Cunha Lima | PB | NÃO |
Dalirio Beber | SC | NÃO |
Eduardo Amorim | SE | NÃO |
José Serra | SP | SIM |
Paulo Bauer | SC | SIM |
Ricardo Ferraço | ES | NÃO |
Total PSDB: 9 |
PT | ||
Parlamentar | UF | Voto |
Fátima Bezerra | RN | SIM |
Gleisi Hoffmann | PR | SIM |
Humberto Costa | PE | SIM |
Jorge Viana | AC | NÃO |
José Pimentel | CE | SIM |
Lindbergh Farias | RJ | SIM |
Paulo Paim | RS | SIM |
Paulo Rocha | PA | SIM |
Regina Sousa | PI | SIM |
Total PT: 8 |
PTB | ||
Parlamentar | UF | Voto |
Armando Monteiro | PE | SIM |
Telmário Mota | RR | NÃO |
Total PTB: 2 |
REDE | ||
Parlamentar | UF | Voto |
Randolfe Rodrigues | AP | NÃO |
Total REDE: 1 |
Republicanos (ex-PRB) | ||
Parlamentar | UF | Voto |
Eduardo Lopes | RJ | SIM |
Total Republicanos: 2 | ||
Sem partido | ||
Parlamentar | UF | Voto |
Reguffe | DF | NÃO |
Total Republicanos: 2 |
Na Câmara, o projeto de lei teve 223 votos favoráveis, 209 contra e uma abstenção. A sanção foi realizada por Michel Temer, presidente da República à época.