Em sua quinta e última Copa do Mundo, Messi tenta igualar título de Maradona
Lionel Messi não acaba. E isso é bom para os amantes do futebol. Aos 34 anos, um dos melhores jogadores do mundo vai para a sua quinta Copa. A Argentina se classificou com o empate diante do Brasil em casa e uma sequência de combinações da rodada das Eliminatórias. Tem 29 pontos. Desse modo, seu camisa 10 tem mais uma oportunidade de ganhar um Mundial, o que nunca lhe aconteceu. Em 2014, ele e a seleção argentina estiveram perto disso, na final diante da Alemanha no Maracanã. Mas o time perdeu por 1 a 0 e ficou em segundo lugar.
A história de Messi se confunde com a história das últimas edições das Copas do Mundo. Sua primeira vez foi em 2006, na Alemanha. Ele tinha 18 anos e havia se destacado no Mundial Sub-20 um ano antes, convencendo a comissão técnica do time de cima a levá-lo. Era um aprendiz, com a ansiedade de todo garoto na sua idade faminto por futebol. Queria jogar todas as partidas, fazer o que estava acostumado nas divisões de base. Mas havia um caminho a ser percorrido e que ele precisava respeitar. Messi era um menino. Foi Gerardo Solorio que o fez nas categorias inferiores e o chamou para a Copa. Ele era da comissão de José Pékerman. “Messi fazia a diferença, era especialmente dotado futebolisticamente”, afirmou o profissional para o site Goal anos atrás, explicando a opção pelo garoto em 2006.
Messi não decepcionou. Contra a Sérvia, depois de 16 minutos em campo, fez seu primeiro gol em Mundiais. Ele saiu do banco para ajudar seu país e se transformou no atleta mais jovem da Argentina a marcar em Copas. A sombra de Maradona ainda não o perseguia. Mais tarde, os apaixonados pelo futebol da seleção nunca mais pararam de compará-lo ao grande astro morto no ano passado, aos 60 anos.
Em 2006, Messi sentiu pela primeira vez o sabor de uma Copa. Não é uma competição qualquer. Garoto ainda, não era o jogador em que se transformou nem tinha qualquer liderança no vestiário. Era calado, tímido como sempre foi. Havia outros para decidir tudo por ele. Sua presença na Argentina de 2006 pode ser comparada à convocação de Ronaldo para o Mundial de 1994, quando Parreira levou o garoto para ele ganhar experiência e já ir se acostumando com o que lhe traçava o futuro. Para Messi, concordando ou não, aquela Copa foi um aprendizado.
Ainda na Alemanha, Messi teve a chance de ser titular na partida contra a Holanda. A Argentina tinha Ayala, Riquelme, Crespo (ex-técnico do São Paulo), Cambiasso e outros mais experientes do que ele. Messi também jogou alguns minutos diante do México, fez até um gol, mas foi anulado. Nas quartas de final, contra a Alemanha, ficou no banco. O time perdeu e deu adeus à competição. Era a primeira decepção para Messi em Copas, uma sina que o perseguiria. Ele não jogou. A Argentina foi eliminada nos pênaltis. Depois, descobriu-se que ele estava machucado.
Sua imagem no banco foi desoladora. “A imagem de Messi no banco foi dura de ver. Ela correu o mundo. Ele queria jogar, é claro. E ele é um desses craques que se irritam quando perdemos. Os craques se irritam porque querem jogar bem e ganhar tudo”, disse Pékerman anos mais tarde.
Messi aprendeu em 2006 que jogar na seleção era diferente de tudo o que ele conhecia no futebol. Não eram jogos comuns. Não havia outra opção a não ser ganhar. Não havia desculpa capaz de convencer o torcedor, principalmente depois da era Maradona. Messi seria preparado para enfrentar tudo isso. Em 2006, ainda não estava pronto. Precisava ainda entender muitas coisas, se tornar homem e um bom jogador. Ele não foi cobrado pelo fracasso do time.
SUA SEGUNDA COPA, NA ÁFRICA DO SUL – Os quatro anos de uma edição para a outra da Copa do Mundo catapultaram Messi a um outro nível no futebol mundial. Quando chegou à África do Sul, em 2010, ele já era o camisa 10 do Barcelona e já havia sido eleito, ao menos uma vez, o melhor jogador do mundo. O mundo esportivo também acompanharia com grande entusiasmo dois dos melhores jogadores que a Argentina já teve juntos em um Mundial. Messi seria treinado por Diego Armando Maradona, referência maior no seu país, consagrado na Europa e em Copas.
Messi também idolatrava Maradona, então não tinha como aquela parceria dar errado. Eles se davam bem e havia respeito mútuo. Só não se sabia se a dupla seria suficiente para ganhar a competição. Nas entrelinhas da relação de ambos na África do Sul, havia a certeza de que Messi um dia ocuparia o lugar deixado por Maradona no futebol, um vazio enorme após sua aposentadoria, cheio de feridas abertas e títulos. Messi já era Messi na Espanha e na Europa, mas ainda não tinha a mesma importância e reconhecimento com a camisa da seleção como foi Maradona, campeão do mundo em 1986. Diego disputou outros três Mundiais, os de 19982, 1990 e 1994. Foi vice-campeão em 90. Messi ainda não era nada disso.
Apesar das afinidades, Messi e Maradona sempre foram diferentes. Messi manteve seu jeitão calado e tímido, sem demonstrar seus sentimentos nas vitórias ou nas derrotas. Maradona era expansivo, mais latino, divertido e bagunceiro. Gostava de dançar, de falar alto e de roubar a cena onde quer que estivesse. No futebol, eles enfrentaram os desafios de formas distintas.
Ao seu lado naquele Mundial, Messi tinha Carlitos Tevez, Higuaín, Di María e outros mais. Consagrou todos eles, mas não marcou um único gol no torneio. O camisa 10 conduziu sem sobressaltos a seleção na fase de grupos, passando por Nigéria, Coreia do Sul e Grécia. Não era uma chave dura. Depois despachou o México até se reencontrar com a Alemanha. E mais uma vez a Argentina caiu diante do poder de fogo dos alemães, time já comandado por Joachim Löw. Messi já tinha 23 anos, e mais uma vez sentia o dissabor da derrota em uma Copa. Maradona, em 1982, com idade parecida, também não conseguiu muita coisa na Espanha, diga-se.
PELA TERCEIRA VEZ, NO BRASIL – Não havia dúvidas de que a Copa de Messi era a do Brasil, em 2014. Ele já era soberano na Europa, eleito tantas vezes o melhor do mundo, jogador admirado por todos e de uma magia que já atendia o imaginário do torcedor. A distância de sua história no futebol perto do legado de Maradona já era mais curta. Muitos já apontavam Messi como maior até do que Diego, não na Argentina.
O elenco vinha crescendo sob a liderança de Messi, mais velho, mais maduro e mais dono da equipe. Mas ele ainda vivia às turras com suas próprias apresentações. Elas não eram ainda nem de longe perto do que ele fazia no Barcelona. No Brasil, ele liderou como nunca antes a seleção de seu país. Os argentinos invadiram o país vizinho cheios de esperança e sonho e estiveram com ele e com o time até o fim, que seria na final com a Alemanha no Maracanã. Mais uma vez contra os alemães.
Antes disso, havia uma fila de rivais que Messi e seus companheiros tinham de derrubar e eles foram caindo um a um. O time entendeu que precisava jogar pelo camisa 10, em função dele, para que seu talento pudesse decidir as partidas. Messi não decepcionou. Tinha sobre seus ombros, como sempre teve, um país inteiro, mas era bancado pelo seu sucesso no Campeonato Espanhol e na Liga dos Campeões. Não havia qualquer sombra de dúvida do que Messi podia fazer. “Sabíamos por onde ele jogava, e como gostava de jogar. Víamos muito o Barcelona, então sabíamos como ele gostava de atuar: pela ponta-direita, porque quando corta para o meio fica com todo o gol à sua disposição, seja para finalizar, arriscar um chute ou para cruzar para os atacantes”, disse Julian Camino, membro da comissão técnica de Alejandro Sabella, ao Goal.
O time passou pela fase de grupos até começar a se enroscar nos mata-mata. Teve problemas contra a Suíça e diante da Holanda, em jogos com prorrogação e pênaltis. Mas conseguiu seu objetivo: chegar à final. Do outro lado do chaveamento, o Brasil sucumbiu diante da Alemanha (7 a 1) e abriu caminho para o time alemão voltar a enfrentar Messi e os argentinos numa decisão de Copa.
No Maracanã, a Argentina teve duas boas oportunidades de marcar gols, uma com Higuaín e outra com o próprio Messi. O jogo foi para a prorrogação e a Alemanha ganhou por 1 a 0. O vice-campeonato igualava Messi a Maradona em 1990, mas ainda falta a taça. Messi ameaçou deixar a seleção. Não se sabia se ele estaria quatro anos depois na Rússia. Pediu um tempo.
NA RÚSSIA, PELA QUARTA VEZ – Foi a pior Copa de Messi e da Argentina. Por pouco, bem pouco, o time não parou na primeira fase daquele Mundial da Rússia. Os problemas para Messi começaram bem antes disso. Depois do vice-campeonato no Brasil, a Argentina perdeu outras duas finais de Copa América, em 2015 e 2016. Nessa última, o camisa 10 perdeu pênalti na decisão e disse que não voltaria mais. Era fim de linha para ele na seleção. Não havia condição emocional para seguir.
Já deu. Para mim acaba aqui a seleção. Já tentei muito, me dói mais do que ninguém não poder ser campeão com a Argentina, mas é assim, não sei e infelizmente vou embora sem conseguir”, disse Messi, abatido após aquela final de Copa América. Dessa forma, ele anunciava sua saída. Houve comoção.
Mas para o bem do futebol, Messi não cumpriu o que falou. Não havia outro como ele. A Argentina ainda precisava dele e Messi sabia que sua história com a seleção ainda não havia terminado. Ele então refez suas declarações. “Vejo que existem muitos problemas no futebol argentino e não pretendo criar mais um. Não quero causar nenhum dano, sempre quis o contrário, ajudar em tudo o que puder. É necessário arrumar muitas coisas do nosso futebol argentino, mas prefiro fazê-lo de dentro e não criticando de fora. Passaram muitas coisas pela minha cabeça no dia da última final e pensei seriamente em deixar o time, mas amo demais o meu país e essa camisa”, informou em comunicado.
Portanto, Messi estava de volta. Foram dele os três gols contra o Equador na vitória de 3 a 1 nas Eliminatórias que confirmaram a Argentina na Copa do Mundo da Rússia. Messi parecia mais animado. Mas ele e Jorge Sampaoli, o novo técnico escolhido pela AFA após o argentino fazer boa campanha com o Chile, não dariam certo. A Copa foi um fiasco por causa disso. Messi liderou o grupo contra as ordens do treinador. Não havia como dar certo. Dos três primeiros jogos da fase de grupos, a seleção empatou com a Islândia por 1 a 1, perdeu para a Croácia por 3 a 0 e ganhou da Nigéria por 2 a 1. Chegou para as oitavas cambaleando. E caiu diante da França: 4 a 3. Messi, mais uma vez, passava longe da taça e de igualar Maradona.
Para o Catar, o time argentino está reformulado, mas continua sob o comando de campo de Messi. Ele terá 35 anos na disputa de 2022. Messi e o treinador Lionel Scaloni se dão muito bem. Um entende as necessidade do outro. Será a última Copa de Messi, com todas as esperanças de conquistas renovadas mais uma vez.