Com seleções definidas, Qatar se prepara para ‘Copa de bolso’
ALEX SABINO SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Em uma rara conversa com a imprensa, Hassan Al Thawadi, secretário-geral do Comitê para Execução e Legado da Copa do Mundo de 2022, disse a jornalistas ocidentais no final de 2019 algo que era óbvio para os qataris, mas novidade para estrangeiros.
Com os grupos sorteados e a definição das 32 seleções, o Qatar diz estar pronto para o pontapé inicial. Todos os oito estádios estão praticamente finalizados. A estrutura para o evento foi construída, o que inclui um distrito próximo a Doha, Lusail, para receber o jogo de abertura e a final.
Uma das características inéditas do torneio deste ano serão as distâncias.
“Será uma espécie de Copa do Mundo de bolso. Os percursos serão rápidos, não há nada muito longe”, opinou o espanhol Felix Sánchez Bas, técnico da seleção qatari.
Pela primeira vez na história, não será propriamente um Mundial em um país, mas basicamente concentrado em uma cidade. Doha tem quatro dos oito estádios construídos ou reconstruídos para o evento. E mesmo os que não estão na capital são próximos. A maior distância entre duas arenas será de 75 quilômetros. Uma viagem de cerca de uma hora.
Na Copa da Rússia, em 2018, Kaliningrado e Ecaterimburgo, duas cidades que receberam partidas, estavam separadas por 2.488 quilômetros. Quase o suficiente para ir de São Paulo a Manaus (2.693 quilômetros). Quem saiu de Moscou após a fase de grupos e foi a Kazan acompanhar Argentina x França, pelas oitavas de final, viajou 17 horas de trem.
O Qatar será o menor país, em extensão, a receber o torneio. Seus 11.571 quilômetros quadrados representam quase quatro vezes menos do que a Suíça (41.285 quilômetros quadrados), até hoje o menor território a abrigar a Copa do Mundo, em 1954.
Para as partidas da fase de grupos em 2018, o Brasil viajou cerca de 1.500 quilômetros (sem contar os retornos a Sochi, onde estava concentrado) para jogar em Rostov-do-Don, São Petersburgo e Moscou. Neste ano, serão 50 quilômetros
Nos seus três jogos no torneio de 2014, no Brasil, a Inglaterra percorreu 3.285 quilômetros entre Manaus, São Paulo e Belo Horizonte. Serão 104 quilômetros em 2022.
O torcedor poderá também ter uma experiência rara em Copas do Mundo: a possibilidade de ver mais de uma partida no mesmo dia, a depender do intervalo entre os dois confrontos.
“Isso vai nos trazer desafios, mas sempre acreditamos que o Mundial é uma força de transformação também na sociedade”, afirmou Hassan Al Thawadi.
Essa é uma linha de pensamento sempre apresentada pelas autoridades qataris e pela organização da Copa a cada crítica e questionamento. Como na questão dos direitos da força trabalhadora migrante. Da população de cerca de três milhões de pessoas no país, apenas cerca de 350 mil são qataris.
Pode ser também para questões consideradas delicadas na relação entre o Ocidente e países islâmicos. Como os direitos da comunidade LGBTQIA+. Na conversa com os jornalistas há três anos, que teve a participação da Folha, Al Thawadi pediu que os visitantes estejam abertos a entender e abraçar a cultura do Qatar, onde as manifestações públicas de afeto são proibidas.
Uma Copa do Mundo tão enxuta na questão territorial traz problemas de hospedagem e locomoção O governo acredita que vai receber cerca de 1,2 milhão de visitantes durante o torneio. A esperança não declarada da Fifa sempre foi que os torcedores/turistas não ficassem o tempo todo em Doha, mas viajassem pela região. O maior atrativo seria Dubai, nos Emirados Árabes Unidos.
Até janeiro de 2021 havia um boicote de Emirados Árabes Unidos, Arábia Saudita e Egito ao Qatar. Em parte, pela crença de que o país acoberta e financia atos de terrorismo, o que sempre foi negado.
O governo qatari chamou esse boicote de “bloqueio ilegal”, mas foi um ato que fechou fronteiras e impediu rotas aéreas que a Fifa sempre considerou fundamentais para o sucesso da Copa do Mundo. Por isso, a entidade agiu nos bastidores para resolver o problema.
A possibilidade de se deslocar entre diferentes nações vizinhas pode aliviar, mas não resolve um potencial problema de acomodação a ser encontrado por torcedores que forem ao Mundial. Estarão disponíveis, segundo a agência Associated Press, 90 mil quartos de hotel no Qatar.
Empresas áreas lançaram passagens de ida e volta no mesmo dia saindo de Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos. O turista poderia embarcar, ver a partida e retornar horas depois. No site oficial do torneio, são oferecidas opções de apartamentos, vilas particulares, hotéis, cabines de camping e estadias em navios que ficarão atracados no porto de Doha.
A Fifa tem solicitado que todos os hotéis da lista oficial fornecida pela organização concordem com uma cláusula de não discriminação contra hóspedes, sob o risco de exclusão do credenciamento para a competição.
A medida foi adotada após investigação de jornalistas noruegueses barrados em três hotéis credenciados pela Fifa. Eles se passaram por um casal homossexual ao tentar reservar um quarto e tiveram acesso negado.