Apoio ao SUS e prevenção de pandemias inexistem em planos de governo, diz estudo

Apoio ao SUS e prevenção de pandemias inexistem em planos de governo, diz estudo

Os candidatos que concorrem ao segundo turno das eleições quase não mencionam ações para apoio ao SUS (Sistema Único de Saúde), para assistência para pessoas com Covid longa e para prevenir epidemias futuras.

A análise, feita por pesquisadores da Rede de Pesquisa Solidária, do Departamento de Ciência Política da USP e do Observatório Covid-19 BR, comparou os planos de governo dos dois candidatos à Presidência, o atual presidente Jair Bolsonaro (PL) e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), e dos candidatos aos governos estaduais no que diz respeito às políticas na área de saúde.

A nota comparou ainda cada um dos temas com o considerado como ideal pelos especialistas –por exemplo, aumentar o número de laboratórios públicos capacitados para fazer vigilância de doenças emergentes.

Outras políticas pouco ou não citadas são o acesso a medicamentos para tratar casos graves de Covid, como o Paxlovid, e a retomada de atendimentos represados durante a pandemia. Já priorizar a vacinação é citado apenas nos planos de governo de Lula e Haddad.

Como resultado, os cientistas viram que 3 dos 6 pontos analisados constam no plano de governo de Lula, embora algumas das ações não apresentem detalhamento de como executá-las. Bolsonaro não cita nenhum dos seis pontos em sua plataforma.

Já na comparação entre os estados, apesar de terem analisado os 12 estados que terão segundo turno, os pesquisadores só incluíram na nota as propostas dos candidatos em São Paulo por serem os mais contrastantes. O candidato Fernando Haddad (PT), ex-prefeito de São Paulo, incluiu 5 das 6 ações previstas, enquanto Tarcísio de Freitas (Republicanos), ex-ministro no governo Bolsonaro, apresentou apenas 2 de 6.

Para Lorena Barberia, pesquisadora do departamento de ciência política da USP e primeira autora do estudo, a ausência quase total de ações para prevenção de epidemias e de cuidado com a Covid destoam do consenso mundial. “Se viesse um extraterrestre hoje e pousasse no Brasil, ele teria a impressão de que não passamos por nada na pandemia. É uma eleição em que a maioria dos planos não se propõe a pensar a melhor forma de evitar uma epidemia futura”, diz.

Ainda de acordo com ela, a ausência nos planos de governo tanto a nível nacional quanto estadual de ações para fortalecimento do SUS e retomada de atendimentos represados reflete uma deficiência histórica da saúde como pauta prioritária no debate político. “É importante ressaltar que, apesar de termos o SUS, ele não foi suficiente na pandemia para dar conta dos desafios e problemas. A falta de investimento e de políticas nesse setor vai criar ainda mais dificuldades nos próximos anos, seja qual for o governo eleito”, reflete.

Uma das autoras do estudo, Tatiane Moraes, que também é pesquisadora da Fiocruz, reforça essa visão. “Se não temos uma proposta, é o mesmo que dizer que não aprendemos nenhuma lição [com a pandemia], que a resposta foi boa, o que não é verdade”, diz.

As pesquisadoras citam alguns dos pontos que precisam de especial atenção, como a aquisição e priorização de campanhas de vacinação contra Covid, o corte no orçamento de saúde neste ano em comparação aos dois primeiros anos da pandemia e a falta de uma ação coordenada para retomar os atendimentos médicos. “A pandemia pressionou todos os serviços, o número de mortes evitáveis no Brasil foi enorme, e isso não está refletido nos planos de governo”, afirma Moraes.

No caso dos atendimentos, há ainda um agravante, que é o esgotamento das equipes de saúde, que sofreram não só psicologicamente, mas também tiveram redução no número de profissionais, muitos acometidos pela própria Covid.

A nota destaca ainda o plano de governo de Haddad, que é o único a mencionar, com detalhes, um plano para priorização de ações de vigilância de emergências futuras, com articulação das secretarias de Saúde, de Ciência e Tecnologia e instituições de pesquisa.

OUTRO LADO

A reportagem procurou as assessorias de imprensa das campanhas de Bolsonaro e Lula.

A do atual presidente da República não respondeu à reportagem até a publicação deste texto.

A do ex-presidente se manifestou por meio de nota. Em relação à articulação, disse que o Ministério da Saúde voltará a coordenar o sistema nacional de saúde, fortalecendo a gestão única pelas três esferas de governo.

Em relação à vigilância epidemiológica, o plano de Lula prevê a criação de uma rede nacional de controle e vigilância de doenças e emergências sanitárias, o fortalecimento da rede existente (VigiAR) e parcerias com estados, municípios, institutos de pesquisa e laboratórios públicos.

Sobre o tratamento de casos graves e óbitos, afirmou que vai organizar o acesso aos serviços de saúde e os serviços hospitalares do SUS, além de capacitar equipes de atenção básica. Quanto à priorização da vacinação, a ideia anunciada é recuperar a alta cobertura vacinal, inclusive com quatro doses de vacina contra Covid acima de 95%.

Os concorrentes ao governo paulista também se manifestaram por meio de nota.

A campanha de Tarcísio disse prever a criação de um centro de controle de doenças e qualidade assistencial e a implantação de um sistema para monitorar e combater epidemias e pandemias. Isso, acrescentou, exigirá investir na substituição de tecnologias defasadas, informatizar serviços de coleta de dados e estimular a qualificação de prestadores de serviço.

Em relação a vacinas, as quais definiu como “uma das intervenções mais custo-efetivas em saúde pública”, prometeu fazer campanhas e disponibilizar para a população todos as vacinas que constam do Programa Nacional de Imunizações (PNI).

Para a gestão do sistema de saúde, a campanha do ex-ministro disse que vai liderar um processo de convencimento e construção “de uma regionalização cooperativa no estado, repactuando o financiamento com a União e municípios” e que quer multiplicar redes assistenciais e melhorar a coordenação regional, com foco na atenção primária e na saúde de famílias.

A campanha de Haddad afirmou que pretende pactuar com municípios, em janeiro, ações como mutirões e investimento em telessaúde para acelerar o acesso a consultas, exames e cirurgias represadas durante a pandemia. Além disso, afirmou que nos primeiros meses reestruturará o acesso à atenção especializada.

Constam do plano do ex-prefeito, ainda, a intenção de implantar 70 hospitais-dias (60 deles no interior), a de firmar parcerias da rede estadual com a municipal, hospitais universitários e Santas Casas e a de implantar um sistema de transporte regional para atender pacientes e seus acompanhantes.

Quanto à gestão do sistema, a campanha do petista afirmou que a parceria com as cidades se dará por meio de apoio institucional e investimento na formação e educação de equipes municipais de gestão e assistenciais. Também citou, entre outras, as ideias de elevar progressivamente o valor do piso da atenção básica estadual e de cofinanciar o Samu.

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