TJMG ajudou 16,7 mil mineiros a terem nome do pai na certidão
O nascimento do segundo filho da manicure Cristiane Aparecida Rodrigues Prado, 39, significou para ela o início de um imbróglio que arrastou-se por um ano para assegurar que o pai do menino o registrasse em cartório. A disputa terminou apenas com a intervenção do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG).
Valendo-se de um teste de material genético que comprovou a relação de paternidade entre o ex-namorado de Cristiane e o filho dela, o órgão impôs que o homem reconhecesse a criança. A partir de então, a certidão de nascimento do garoto passou a ser impressa com o nome do genitor.
Assim como o filho de Cristiane, hoje órfão de pai e com 7 anos, cerca de 16,7 mil moradores de Belo Horizonte e da região metropolitana conseguiram, por meio do Centro de Reconhecimento de Paternidade (CRP), que em seus documentos constasse os nomes de seus pais e avós paternos.
O serviço do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) completa a primeira década de existência em 2021 – como também ocorre com o mutirão Direito a Ter Pai, da Defensoria Pública de Minas Gerais (DPMG), que, igualmente há dez anos, busca soluções extrajudiciais para impasses ligados a paternidade.
O balanço dos dois programas que oferecem auxílio gratuito àqueles que não têm os nomes dos genitores em suas certidões é visto como positivo por especialistas.
“Ações de reconhecimento de paternidade são, hoje, de amplo conhecimento da população, e são importantes por ser alto o número de pessoas que têm essa lacuna em seus documentos, o que provoca danos afetivos, emocionais, psicológicos e materiais”, avalia Caroline Loureiro, especialista em direito de família da Defensoria.
Com edições anuais iniciadas em 2011, o mutirão Direito a Ter Pai assegurou respaldo jurídico a cerca de 56 mil pessoas que buscaram por ações de reconhecimento de paternidade. Ainda, em uma década, a Defensoria Pública mineira pagou por mais de 9.000 exames de DNA para famílias que recorreram ao mutirão.
Sem queda na demanda
A procura pelo Centro de Reconhecimento de Paternidade (CRP) é também tão expressiva que não foi registrada queda no número de solicitações apesar da pandemia de Covid-19. Pelo contrário, somente entre os meses de março e dezembro do ano passado, o CRP contabilizou um índice recorde de audiências online – foram 680 no período.
“O volume de atendimentos no CRP sempre foi alto. Agora, com a pandemia, não deixou de ser. Inicialmente, nós não esperávamos que a modalidade online teria uma adesão tão considerável. Eu não imaginava que o pessoal iria se adaptar tão bem”, analisa Claudinéa de Oliveira Alves, responsável pelo CRP, que funciona dentro do Fórum Lafayette, da avenida Augusto de Lima, na Vara de Registros Públicos de Belo Horizonte.
A tendência de alta na busca pelo serviço, se manteve. Apesar da pandemia, 262 sessões para averiguação de paternidade foram realizadas entre janeiro e abril de 2021 – uma média de três por dia. O elevado número de audiências revela a adesão do público à modalidade online de atendimento imposta pela crise sanitária.
Tipos de reconhecimento de paternidade
Reconhecimento espontâneo
Trata-se do procedimento em que não há dúvidas sobre a paternidade. Portanto, não é necessário teste genético, e o pai se declara voluntariamente.
Paternidade socioafetiva
É quando o teste genético de DNA indica resultado negativo para a paternidade, mas, mesmo assim, o suposto pai deseja assumir a criança.
Reconhecimento por DNA
Ocorre quando o exame genético dá positivo. Assim, é reimpressa uma nova certidão de nascimento com o nome do pai – se o filho já for casado, a Justiça também emite uma nova certidão.
Investigação de paternidade
Quando o suposto pai não responde à Justiça, abre-se um procedimento de averiguação de paternidade. Se ele se recusar a se submeter ao teste de DNA, a Justiça presume confirmação da paternidade.
Especialistas ressaltam a importância do reconhecimento
O exemplo do caso de Cristiane, centenas de mães recorrem diariamente à Defensoria Pública de Minas Gerais (DPMG) e à assistência do Centro de Reconhecimento de Paternidade (CRP) para garantir e até mesmo obrigar que os genitores exerçam a paternidade, como esclarece a especialista em direito de família da DPMG, Caroline Loureiro.
“A maioria das pessoas que recebemos é de mães, representantes legais, que busca pelos direitos de seus filhos. O número de adultos que vêm à Defensoria Pública para ter o nome dos pais em suas certidões é inferior ao de solicitações feitas por representantes legais para seus menores. Normalmente, é a mãe quem vai atrás e que está à procura de um direito do filho”, explica.
De acordo com ela, o segundo público majoritário nas ações de paternidade são filhos que, adultos, buscam ter o nome do genitor em seus documentos.
Lado emocional
Para Claudinéa de Oliveira Alves, conhecer quem é o pai é indispensável para o fortalecimento emocional do indivíduo. “Para a criança, e mesmo para o adulto, é fundamental saber quem é o pai. Como você explica, quando ela começa a crescer, coisas como ‘você não tem pai’ ou ‘seu pai não quis saber de você’? É um trauma muito grande”, afirma Alves.
Segundo ela, além disso, existe a premissa básica dos direitos da mãe e da criança. “A mãe não fez o filho sozinha, então, porque ela seria obrigada a criá-lo sozinha?”, indaga a coordenadora do CRP, vinculado ao TJMG.
Pai negou o filho mesmo após exame de DNA
O primeiro processo de Cristiane contra o ex-companheiro foi perpetrado ainda na gestação. “Ele não me ajudava e desapareceu no mapa. Um dia, no telefone, ele me disse: “Quer seus direitos? Entra na Justiça!”, relembra a manicure.
Depois de receber parecer favorável da Justiça, que lhe concedeu a fixação do pagamento da ação de alimentos, Cristiane foi obrigada a lidar com as desconfianças do ex-namorado sobre a gestação.
“Ele disse que o filho não era dele. Fizemos um teste de DNA. E, mesmo depois de dar positivo, ele não quis registrar o bebê”. O pai da criança foi obrigado pelo Ministério Público a reconhecê-la.
“Sem o reconhecimento, a criança é privada de seu direito à pensão alimentícia e, depois da morte do pai, de acessar a herança”, reforça a defensora pública Caroline Loureiro.
Serviço
Como acessar o CRP
O Centro de Reconhecimento de Paternidade (CRP) atende casos nos quais o filho não possui o nome do pai na certidão registrada em Belo Horizonte ou nos municípios da região metropolitana. Em função da pandemia, os atendimentos estão agendados pelos seguintes telefones: (31) 3330-4365; (31) 3330-4366; e (31) 98432-4675
Mutirão “Direito de Ter Pai”
As datas e locais da realização do mutirão Direito a Ter Pai são sempre divulgadas com certa antecedência por meio do site da Defensoria Pública de Minas (DPMG) – defensoria.mg.def.br – e também por meio das redes sociais do órgão, no perfil do Twitter @defensoriamg ou pelo Instagram @defensoriamineira.