Defensoria move ação contra exigência de autorização do marido para colocar DIU
A Defensoria Pública de São Paulo, por meio do Nudem (Núcleo Especializado de Promoção e Defesa dos Direitos das Mulheres) e do Nudecon (Núcleo Especializado de Defesa do Consumidor), entrou, nesta terça-feira (22), com uma ação civil pública contra a Unimed Ourinhos (a 372 km da capital paulista). No processo, o órgão pede reparação, alegando que a operadora exigiu assinatura do marido ou companheiro para a implantação do DIU em mulheres.
Reportagem do jornal Folha de S.Paulo de agosto do ano passado mostrou que operadoras exigiam o consentimento de maridos antes de colocar o dispositivo.
Por meio de nota, a Unimed de Ourinhos afirma que desconhece o ajuizamento da ação civil pública e que, quando questionada, prestou os devidos esclarecimentos aos órgãos competentes.
Na tentativa de resolver o caso no âmbito extrajudicial, a Defensoria Pública solicitou à operadora a comprovação de que haveria uma instrução dentro da empresa para que ninguém fizesse tal exigência. O pedido não foi atendido, segundo o órgão.
Na época, a defensoria oficiou a Unimed algumas vezes com questionamentos sobre o caso. As respostas foram evasivas, e algumas perguntas nem foram respondidas, segundo a defensora Estela Waksberg Guerrini, do Nudecon.
À defensoria, a Unimed disse que não negou nenhum procedimento pela falta da anuência do marido.
“Não importa tanto quantas mulheres tiveram o procedimento negado, porque não são só essas mulheres as vítimas. A mulher que teve que buscar a assinatura do marido e fez o procedimento e qualquer outra mulher são vítimas pelo simples fato de existir um campo que pede a assinatura do marido. É ilegal, uma prática abusiva, que fere a liberdade de escolha e a disposição do próprio corpo da mulher”, ressalta.
Na ação, a defensoria cobra R$ 2 milhões pelos danos morais causados às mulheres submetidas à exigência. O órgão vai pedir que o valor seja revertido ao Fundo Estadual de Defesa dos Interesses Difusos e empregado em programas de promoção à saúde da mulher.
Além disso, a Defensoria pede que o plano de saúde produza e entregue às pacientes um guia de direitos sexuais reprodutivos, informe no site e no próprio termo de consentimento para a inserção do DIU que o procedimento pode ser realizado sem a anuência do parceiro e capacite os funcionários para evitar que a exigência volte a ser feita.
Para a defensora Nalida Coelho Monte, do Nudem, a conduta da Unimed reforçou de modo significativo o controle sobre o corpo da mulher, principalmente quando se leva em consideração o exercício livre e autônomo dos direitos sexuais reprodutivos.
“É como se ainda o casamento ou a união estável conduzisse as mulheres casadas a uma redução de status, na qual ela precisaria de uma autorização do parceiro para decidir que métodos contraceptivos poderia usar”, afirma.
Para exigir o consentimento do marido, as seguradoras se amparam na lei 9.263 de 1996, que dispõe sobre o planejamento familiar. Na avaliação de Nalida, a lei não se aplica a este caso. O DIU não é um método de esterilização, mas contraceptivo.
“A interpretação é que somente para laqueadura é que há a necessidade de autorização do parceiro, mas ainda assim é importante ressaltar que a constitucionalidade dessa lei está sendo debatida no STF [Supremo Tribunal Federal]. A gente tem o entendimento de que ela não é. Os direitos sexuais reprodutivos devem ser exercidos de forma autônoma pela pessoa sem que a condição de estar casada tenha influência sobre isso”, explica Nalida.
Após protocolada, a ação será encaminhada para uma das varas da Comarca de Ourinhos. O juiz mandará intimar a Unimed Ourinhos, que fará a contestação. É possível que seja marcada uma audiência de conciliação. Se as partes chegarem a um acordo, este é homologado, e a ação, encerrada.
“Precisar da assinatura do marido para implantar o DIU é um retrocesso que significa violação à lei, à Constituição, à Convenção Internacional das Mulheres. É rebaixar as mulheres casadas ao objeto do marido”, finaliza Guerrini.